Compartilho hoje com vocês um item que conservo em meu acervo com muita nostalgia: um disquete que está comigo desde meados dos anos 90 e que contém nada menos que uma cópia do Bio Menace, grande jogo desenvolvido pela icônica Apogee Software – e um dos títulos preferidos de outro coeditor aqui do blog, o Filipe Veiga). Vejam foto abaixo.
Esta cópia foi adquirida em 1994 na softhouse ShareMania, do Rio de Janeiro, e é um retrato de tempos incríveis que não voltam mais. A etiqueta com o nome do jogo era impressa no ato da compra, em jato de tinta, pela própria ShareMania. A etiqueta menor, com o código 3D0008, foi colada por mim, aos 17 anos (era a forma como eu catalogava meus disquetes: 3D para discos de 3 ½ e 5D para discos de 5 ¼. Não me perguntem porque eu padronizava dessa forma). Estamos falando de um período em que: 1) a cena do shareware estava em plena ebulição; 2) a multimídia começava a mostrar o seu potencial no Brasil; 3) ainda tinha força o conceito de softhouse tal como conhecemos desde os anos 80 com o MSX, o TK-90X (clone brasileiro do ZX Spectrum) e outros microcomputadores, só que desta vez mais focado no Commodore Amiga e no padrão IBM PC, ou seja, um local onde você poderia comprar, a preços bem atraentes, jogos, aplicativos e utilitários (pirataria, a bem dizer, mas isto é outra história). O mais importante neste post é que o disquete segue funcionando. Conseguimos até mesmo rodar o Bio Menace a partir dele!
Capturamos abaixo telas do diretório, que mostram inclusive arquivos referentes ao jogo datados de 1993 (seu ano de lançamento).
E vamos a alguns dos arquivos presentes no disco:
BM-HELP.EXE – Trata-se de um suporte técnico "on-disk", algo como um README, mas em formato de uma aplicação que trazia não só informações detalhadas sobre como rodar o jogo e resolver problemas, mas também as formas de contato com a Apogee para maiores esclarecimentos. Interessante observar a presença desta grande publicadora em uma grande variedade de serviços online: Internet, Compuserve, America Online, Prodigy e em diversos BBSs. Fazendo uma comparação com os dias de hoje, seria o equivalente a estar presente nas principais redes sociais. Este formato de suporte técnico era comum entre as grandes publicadoras da época.
UK_ORDER.TXT – Um arquivo TXT que facilitava o trabalho dos residentes do Reino Unido que desejassem comprar – via Transend Services ltd (uma distribuidora oficial da Apogee na Europa?) – uma cópia completa do jogo via telefone, correio ou fax. Bastava preencher dados como nome, endereço, telefone e quantidade de cópias. Notem que havia até mesmo um campo para o usuário contar como conheceu o jogo Bio Menace. Aqui no Brasil eu vivi com uma certa intensidade a experiência de se comprar jogos nas piratohouses via telefone (sim, algumas ofereciam esta facilidade). Bastava ligar, encomendar a gravação dos jogos em fita cassete ou disquete e combinar o dia que iria buscar. O pagamento era feito no ato, ao buscar o pedido. Era algo tão simples quanto alugar um filme em uma videolocadora, só que via telefone. Mas eu fico imaginando o MUST que deveria ser você ligar para um canal oficial e encomendar uma cópia 100% original do Bio Menace.
Parênteses para a ShareMania: se você frequentava softhouses no Rio de Janeiro e o nome ShareMania não lhe é familiar, você ficará surpreso em saber que se trata nada menos da Nemesis Informática, clássica softhouse que ficava no centro do Rio desde os tempos áureos do MSX. Entre 94 e 95 a chama do freeware e do shareware estava tão acesa que a Nemesis passou a adotar o nome ShareMania em seu catálogo de jogos shareware para PC, como mostra a propaganda abaixo (com preços em URV!), veiculada na revista Micro Sistemas nº 137, do mesmo longínquo ano de 1994.
A Nemesis talvez tenha sido a softhouse que eu mais visitei. Seguramente frequentei este local de 1987 a 1998, e o procedimento para se adquirir jogos e aplicativos era basicamente o mesmo durante todo esse período: eu levava uma mídia virgem (fita cassete, disco de 5 ¼ ou disco de 3 ½ na época em que vendiam jogos de MSX e disco de 3 ½ já na época do 386 ou do 486) ou comprava uma no local, escolhia os jogos em um catálogo e esperava a gravação. No auge do shareware, pagávamos uma quantia simbólica pelo "trabalho de cópia" (nessa época do Bio Menace era algo em torno de R$ 1,00 por jogo). Este era o argumento de muitas piratohouses para contornar a filosofia do shareware de ser distribuído gratuitamente. Ou seja, pagávamos pelo serviço de cópia, e não pelo jogo. E assim as softhouses ganhavam um novo fôlego no negócio de venda de software. Parte dessa atmosfera poderá ser vista no documentário "LOADING... Nossos Primeiros Jogos de Computador", de autoria de Carlos Bighetti e Marcus Garrett, previsto para ser lançado ainda este ano.
Os parênteses acima foram para destacar mais dois arquivos presentes no disquete do Bio Menace:
MENSAGEM.COM – Nada menos que uma propaganda da ShareMania. Trazia o endereço da Nemesis Informática e demais informações sobre shareware. Vale frisar .
GO.BAT – Um arquivo batch que mostra primeiro a propaganda da ShareMania (MENSAGEM.COM) e em seguida executa o Bio Menace (BMENACE1.EXE).
Enfim... Em 1994 a Seleção Brasileira conquistava o tetra; Ayrton Senna e Kurt Cobain nos deixavam; o Visual BASIC era uma das linguagens de programação mais populares; estávamos prestes a presenciar o lançamento do Windows 95; o IBM Aptiva era um sonho de consumo; kits multimídia eram objetos de desejo; e eu, na época com 17 anos, comprava a versão shareware do Bio Menace na ShareMania. E você? Dentro do universo do PC, o que o ano de 1994 lhe faz lembrar?
Em tempo: subimos o conteúdo do disquete para o Internet Archive. Abaixo está também o link para a referida revista Micro Sistemas com o anúncio da ShareMania.
• Micro Sistemas nº 137 no Datassette
• Conteúdo do disquete deste post